Pela liturgia católica, os fiéis durante 40 dias, entre a Quarta-Feira de Cinzas e o Domingo de Ramos, vivem o período Quaresma. Considerando o sincretismo religioso, muitos terreiros de religiões tradicionais africanas incorporam esse período e outras formas de ritualísticas em seus cultos.
A mãe Maria Clara de Obaluaiyê, sacerdotisa e Mãe de Santo do Terreiro Pai Tomáz de Angola, comenta que, durante a Quaresma, “muitos terreiros são fechados, os tambores silenciados e cobertos, partilhando da ideia de silêncio e reflexão que este período anuncia para os Cristãos; outros abrem os rituais apenas para descarregos e limpezas energéticas em geral”.
“Para nós, Terreiro Pai Tomáz de Angola, Terreiro Afroindígena e não sincretizado, seguimos nossas programações normalmente, pois nosso entendimento é de que esse período é comum e não temos nenhuma relação com ele, não consideramos em nossos rituais as práticas sincretizadas, contudo respeitamos os demais cultos”.
Diferente do Terreiro Pai Tómaz de Angola, a Casa de Axé Raiz de Ogum – Ilê Irín Ogum Já segue o sincretismo religioso e acredita que o momento da Quaresma é de oração, recolhimento e penitência.
O sacerdote Diego Rilker, da Casa de Axé Raiz de Ogum, explica que a Quaresma também existe na Umbanda porque, mesmo sendo uma religião de matriz africana, existe o sincretismo religioso com o Cristianismo em alguns terreiros.
Na época do surgimento da Umbanda no Brasil, no ano de 1908, os adeptos não podiam cultuar a religião. Então, eles escondiam os orixás atrás dos santos católicos. Por isso, muitos templos “resguardam o santo e jejuam”, explica o sacerdote.
Diego comenta que o momento da Quaresma é um período de “luto cristão”. Neste momento, “o povo da linha branca, os guias de luz, se retraem mais; e quem toma de conta é o povo da linha da esquerda. A gente também trabalha com os ‘Pretos Velhos’ porque eles têm uma miscigenação, eles ficam liberados para trabalhar nesta época, que é de oração e de cura”.
VISITAÇÕES AOS TERREIROS
Os umbandista que adotam a Quaresma acreditam que o momento precisa de penitência para atravessar os 40 dias de forma coerente às reflexões que o tempo precisa.
“O período da Quaresma é de muita oração, de jejum, de ‘respeito ao nosso ori’. Então, nesse período, a gente se recolhe um pouco no barracão. Em algumas casas, cobrem os tambores. A gente, não. A gente continua tocando, mas só para Exus e Preto Velho”, diz o pai de Diego.
É comum algumas pessoas que visitam os terreiros, sem serem os filhos da casa, ficarem na dúvida sobre as visitações.
Sobre isso, a mãe Maria Clara de Obaluaiyê gosta de fazer a seguinte reflexão: “existe um discurso muito distorcido, carregado de negatividade, quando se fala em Terreiro, uma ideia de sofrimento, punição e demonização de nossos rituais”.
“O racismo religioso impõe e dissemina esse discurso em torno de nossas práticas e isso impede que as pessoas conheçam ou frequentem um Terreiro, e esse sentido socialmente pensado e aceito por muito nos apaga e afeta para além de períodos como Quaresma, por exemplo”.
Maria Clara de Obaluaiyê acrescenta que não há nenhum período restrito considerado inadequado para visitar terreiro, pois, para ela, ele é “território Negro Ancestral.
“É o nosso Chão Sagrado, um espaço em que fortalecemos nossas forças Ancestrais, nosso Axé, alergia plena e bem-estar; onde estamos em Família e com nossos Orixás e Encantados. O Terreiro sempre será para nós um espaço bio-psico-socio-cultural-espiritual-magístico de resgate à nossa Ancestralidade e à nossa própria existência”.
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