Elenilza Silva – Advogada trabalhista
Luana Magalhães – Advogada e mestra em Antropologia
No ano de 2023, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil realizou, em conjunto com a Fundação Getúlio Vargas (FGV), o 1º Estudo Demográfico da Advocacia Brasileira, cujos resultados foram publicados em abril deste ano.
A pesquisa revela que, enquanto 41% das advogadas ganham até 2 salários mínimos, a porcentagem de advogados com a mesma renda é de apenas 27%. A diferença permanece quando se faz um corte mais elevado na renda, como na faixa daqueles que ganham mais de 20 salários mínimos, onde estão 8% dos advogados e apenas 3% de advogadas.
Essa desigualdade salarial se repete quando a análise é feita a partir da raça/cor. Segundo a pesquisa, 45% dos advogados/as pretos/as ganham até 2 salários mínimos, enquanto apenas 3% têm renda acima de 20 salários mínimos. Em contraste, 6% dos advogados/as brancos/as têm renda acima de 20 salários mínimos, e 31% ganham até 2 salários mínimos.
Saindo do cenário nacional e analisando a realidade do Piauí, verifica-se que a profissão é exercida majoritariamente por homens (53%). A advocacia piauiense é majoritariamente negra, sendo 52% parda e 11% preta, frente a 35% de brancos.
O Piauí é o segundo estado com maior porcentagem (45%) de advogados/as que têm renda individual de até 2 salários mínimos, ficando atrás somente da Paraíba com 48%. Nessa perspectiva, outro dado que chama atenção e talvez leve à prematura hipótese sobre a precarização da advocacia é o que indica que 35% dos advogados/as piauienses não têm a advocacia como fonte de renda exclusiva, superando a média nacional de 26%. Desta forma, os/as advogados/as complementam a renda trabalhando como corretor de imóveis, agricultor, vendedor, músico, motorista de aplicativo, etc.
A instabilidade financeira leva profissionais das mais diversas áreas jurídicas a se digladiarem em áreas específicas quando acreditam que tal área está em alta, sem que, contudo, tenham a expertise para a atuação. O resultado é uma prestação de serviços de baixa qualidade e, por isso, de baixo custo, em detrimento dos que fazem da advocacia
especializada e valorizada o seu ofício.
Uma leitura mais simples apontaria para a saturação do mercado; porém, os números indicam que este campo profissional reflete desafios e demandas do país, como baixos salários, a menor renda em estados mais pobres, o racismo e o sexismo. Deve-se mencionar ainda a precarização do ensino e a pouca importância dada pelos futuros
profissionais à matriz curricular nos períodos iniciais.
Nesse viés, é importante ressaltar ainda a necessidade de implementar políticas públicas para as mães. O censo constatou maior presença de advogadas sem filhos, em detrimento de advogados (52% para 33%), expressando uma preocupação feminina em conciliar carreira e maternidade, dadas as dificuldades de reinserção no mercado após o
nascimento dos filhos.
Para ilustrar a perspectiva de que este campo profissional não deixa de refletir as demandas sociais, e como tal, as mães advogadas sofrem dos mesmos problemas, cite-se o caso ocorrido com a advogada Marianne Bernardi (27), grávida de 8 meses, que durante a sessão da 8ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, ocorrida no dia 27/06/2024, teve que aguardar mais de sete horas para realizar a sustentação oral, após ter ao menos cinco pedidos de preferência negados pelo Desembargador Luiz Alberto Vargas. De nada adiantou a positivação do direito à preferência das gestantes na ordem das sustentações orais previstas no art. 7-A, III, do Estatuto da Advocacia e da OAB.
Essa desvalorização generalizada da advocacia contrasta com a essencialidade constitucional da atividade. No fim das contas, os atores do processo são vítimas e algozes na cadeia de aviltamento da profissão, e apenas a consciência dos presentes e futuros danos e a união da classe, da sociedade e do Judiciário poderão barrar este processo de declínio vertiginoso.
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