
O emprego formal, com carteira de trabalho assinada, sempre foi sinônimo de segurança para os brasileiros. Atualmente, são cerca de 39 milhões no mercado formal. No Piauí são quase 370 mil trabalhadores com carteira assinada. Mas um movimento de novas gerações no mercado de trabalho tem questionado esse modelo conhecido como celetista – uma referência à contratação conforme a lei trabalhista – a CLT – que é a sigla para consolidação das leis trabalhistas brasileiras. O que merece atenção por parte de pais, mães, responsáveis e especialistas no mercado de trabalho é o que está por trás dessa onda de aversão ao emprego CLT.
A lei trabalhista é de 1943 e é ela que regula as relações de emprego no Brasil. Os funcionários celetistas têm direitos e deveres regidos por essa lei. Entre os principais direitos estão: férias remuneradas, 13º salário, FGTS, seguro-desemprego, adicionais salariais (noturno, insalubridade, periculosidade), licença-maternidade/paternidade, aviso prévio e salário-família.
O que é visto por adeptos do recente movimento, entretanto, não são as vantagens, os direitos trabalhistas. Para esses jovens, emprego com carteira assinada virou sinônimo de perrengue. Segundo alguns profissionais de carreira com quem eu conversei, essas crianças e jovens cresceram sem os pais por perto, porque eles estavam sempre muito atarefados com o trabalho e sem tempo para si mesmos e para a família. É o retrato de quem tem uma vida muito dura, acorda às cinco da manhã e pega ônibus lotado para ainda ter que ouvir bronca de chefe ruim, muitas vezes pra ganhar um salário quem nem dá pra passar o mês inteiro. E assim, com base nesse pensamento, se multiplicam nas redes sociais vídeos propagando essa corrente contrária ao emprego CLT.
Frases como “se tudo der errado, eu viro CLT” ou “não conheço nenhum CLT que ficou rico” – se espalham, viralizam (como se diz nas redes) e influenciam outras pessoas. Alguns jovens que propagam a ideia nunca nem trabalharam na vida ou sabem qual o conteúdo da Consolidação das Leis Trabalhistas. Muitos nem têm ideia do que o debate realmente significa, seja pela inexperiência de vida e profissional, seja pela imaturidade que os perfis escondem.
É preciso trazer para esse debate que aqueles trabalhadores que não têm carteira assinada, muitas vezes estão sujeitos à falta de direitos básicos quando não se formalizam como Microempreendedores Individuais (MEI) ou outra forma de registro. Há que se levar em consideração ainda que muitos empresários dedicam muito mais horas de trabalho diárias que as oito dos celetistas.
No Piauí, o movimento de aversão ainda não é tão grande quanto nacionalmente. Um raio X do mercado de trabalho no estado ajuda a explicar. O Piauí é recordista na geração de empregos formais na região Nordeste. Atualmente, o estoque de empregos formais no estado chegou a 368.971, segundo o Ministério do Trabalho. Por outro lado, a taxa de informalidade é enorme por aqui. Cerca de 54% dos piauienses ocupados estão na informalidade – dados da PNAD Contínua do IBGE, o primeiro trimestre de 2025. Está foi a terceira maior taxa de informalidade registrada no país.
Fato é que o movimento anti-CLT cresce e já atinge os jovens piauienses a ponto do meu filho de 10 anos me chamar de “CLTrouxa” – expressão típica dos vídeos curtos (shorts) do YouTube aos quais ele tem acesso. Claro que eu fiz uma palestra completa para ele mostrando o que é CLT e todas as nuances que essa discussão envolve.
Esta é uma discussão profunda que merece mais e mais reflexões e debates, principalmente para entendermos por que uma geração inteira está sendo moldada por essa nova perspectiva e identificar se o problema não está justamente no formato atual de trabalho no Brasil. Mas esse é um assunto para outro artigo.