16 de outubro de 2025

#Anistia7Set x #PECdaBlindagem: A raiva viralizou contra a PEC da blindagem, mas a pauta da anistia não saiu da bolha

Sociólogo
Publicado em 09/10/2025 06:00

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A política brasileira tem sido marcada cada vez mais pelo campo das emoções. As redes sociais transformaram indignação, apoio e silêncio em matéria-prima do debate público. Nesse cenário, surge uma questão essencial: que tipo de polarização emocional aparece nas redes diante dos atos pró-anistia de 7 de setembro e do debate contra a PEC da blindagem? Essa pergunta é relevante porque indica que a política não se reduz ao espaço dos argumentos já conhecidos da razão. Ela também se alimenta de afetos que circulam em larga escala e moldam percepções coletivas sobre a democracia.

As pesquisas recentes oferecem pistas importantes. A Quaest analisou 2,3 milhões de comentários sobre a PEC da blindagem entre 16 e 19 de setembro e concluiu que oitenta e três por cento das menções foram negativas. A indignação foi a emoção predominante. Já a Exata, em parceria com a AP, examinou cinquenta mil menções sobre os atos pró-anistia de 7 de setembro. O tema não ganhou tração significativa e não mobilizou sentimentos amplos. O que se destacou foi a indiferença. Esse contraste mostra como dois temas relevantes no debate político geraram efeitos emocionais muito distintos na esfera digital.

Não se trata apenas de números, eles apenas nos ajudam a mensurar. O que os dados revelam é a forma como a política se organiza em torno de afetos. É nesse ponto que a leitura da socióloga Eva Illouz se torna indispensável. Para ela, vivemos em um capitalismo emocional, no qual as emoções não são apenas expressões íntimas, mas produções sociais moldadas por instituições e intensificadas pela tecnologia. Nas redes sociais, sentimentos circulam em ritmo acelerado e são amplificados pelos algoritmos. Emoções que geram maior engajamento, como a raiva e a indignação, recebem mais visibilidade. Por isso, a rejeição à PEC da blindagem não pode ser entendida apenas como reação espontânea. Ela foi potencializada por um ambiente digital que transforma emoções em força política.

Já no caso da anistia, observamos outro movimento. O discurso não encontrou eco amplo. Ficou restrito a apoiadores mais fiéis e não conseguiu se converter em emoção compartilhada. Esse silêncio mostra os limites dos mercados emocionais. Nem todo tema político consegue mobilizar afetos em larga escala. Nem toda bandeira encontra ressonância suficiente para se transformar em narrativa de massa. O contraste entre a indignação contra a PEC e a apatia diante da anistia revela como certas pautas conseguem gerar energia política enquanto outras permanecem marginais.

Pensar a política a partir das emoções não é abandonar a razão. Eva Illouz lembra que emoções são fatos sociais e, portanto, podem e devem ser analisadas cientificamente. Estudar sentimentos não significa ceder ao irracional. Pelo contrário. É compreender de forma objetiva como eles estruturam práticas, crenças e decisões políticas. A sociologia, ao olhar para as emoções, mostra que elas são parte constitutiva da vida pública e não um desvio da racionalidade.

Claro que há limites nesse tipo de análise. A classificação de sentimentos pode falhar diante da ironia ou do sarcasmo. Além disso, o universo digital não representa todos os brasileiros. Mas ainda assim, as redes funcionam como um termômetro social. Elas apontam quais narrativas tocam a sensibilidade coletiva e quais discursos não geram ressonância.

O que emerge desse quadro é uma democracia atravessada pelo campo afetivo. A indignação contra a PEC da blindagem foi intensa e generalizada. Já a anistia não conseguiu mobilizar grandes correntes de apoio. Isso sugere que a sociedade reage de forma mais enérgica quando percebe ameaças institucionais diretas e se distancia de propostas radicais que não dialogam com sua experiência concreta. No Brasil atual, compreender a política significa levar a sério os sentimentos que circulam no espaço público. Como lembra Illouz, não há democracia sem a presença dos afetos. Reconhecer esse fato é olhar de modo sociológico para as emoções e entender que, na esfera pública contemporânea, os corações falam tanto quanto as razões.

Francisco Robert Bandeira Gomes da Silva
Doutor em Sociologia


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