6 de julho de 2025

Resgatada de trabalho análogo à escravidão relembra ameaças de madrinha: “Iria arrancar meu coração”

Redação

Publicado em 24/05/2023 16:06

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Janaína Alves foi mantida em cárcere por 15 anos pela patroa – Foto: Isadora Cavalcante

Isadora Cavalcante e Carlienne Carpaso
carlienne@tvclube.com.br

“Ela quebrou um casco de cerveja e falou que iria arrancar meu coração, depois pegou um garfo e disse que iria me matar. Quando eu sai de lá, ela me xingou de tanto nome que chegou a doer. Todos os dias eu sentia tristeza. Ela brigava muito e eu pedi tanto a Deus para me tirarem de lá”.

O forte relato é da Janaína Alves Ferreira, de 27 anos. Depois de 15 anos mantida em cárcere privado e em situação análoga à escravidão, ela foi resgatada, na terça-feira (23), de uma residência no bairro Ilhotas, na zona Sul de Teresina (PI), onde vivia desde os 12 anos, quando deixou o interior do Maranhão com o sonho de ter “uma vida melhor” na capital piauiense.

Ao Portal ClubeNews, em menos de 24 horas após reencontrar a liberdade e os braços da mãe, Janaína relembrou os momentos de uma vivência assustadora na casa de uma família que a prometeu estudos e um bom lugar para morar.

A vítima esqueceu tanto de si que não recordava mais a própria idade, pois acreditava ter apenas 23 anos. Ela não recorda a data do nascimento e conta que nunca estudou na vida. Não aprendeu a ler nem a escrever. “Estou precisando de trabalho, dinheiro e começar a estudar. Consigo agora ter um sonho. Estou mais aliviada, diz.

A PATROA

Janaína relata que a própria madrinha Francisca Danielly Mesquita Medeiros era a responsável por mantê-la em situação análoga a de escravo. Francisca Danielly é empresária e já foi candidata aos cargos de deputado federal e vereadora.  Durante a prisão, a empresária não quis dar entrevista à imprensa. O advogado de defesa também não. O espaço continua aberto para esclarecimentos.

Além das agressões psicológicas, a madrinha não fornecia o básico para a sobrevivência de Janaína. “Eu sentia dores no rim. Ela comprou um dipirona para me sentir melhor e voltar a trabalhar. Nunca fui ao médico. Ela não me pagava um centavo, se precisasse de pasta de dente, shampoo, ela só me dava usado”.

Janaína Alves foi mantida em cárcere por 15 anos pela patroa – Foto: Isadora Cavalcante

O INÍCIO DO RESGATE 

Janaína conta que conheceu seu namorado, o mecânico Osmar Ferreira, quando ia deixar os filhos da madrinha na escola onde eles estudavam. Ele com a ajuda de outras pessoas – que não serão identificadas – conseguiu denunciar o caso à polícia.

Durante as conversas, ela desabafou e revelou a ele a sua situação na casa da empresária. “Ele disse que iria me tirar de lá. Ele [Osmar] me deu um telefone e a gente conversava até ela [madrinha] descobrir. Ela ameaçou polícia para ele”, relembra a jovem.

O mecânico contou que a madrinha da jovem alegava que a vítima sofria de problemas psicológicos como justificativa para o cárcere privado. Ela não podia sair de casa a menos que fosse para cumprir “as obrigações”, como deixar as crianças na escola.

“A gente se via toda vez que ela deixar os meninos na escola, mas não podia demorar muito, pois a patroa [madrinha] iria brigar e ela tinha que voltar para ajeitar a casa, fazer a comida deles. Quando ela descobriu o celular que dei, foi na minha casa devolver e dizer que iria me denunciar para a polícia. Ela dizia ‘você sabia que ela tem problemas mentais? Mas ela não tem”, relatou o namorado de Janaína.

Janaína com a mãe e o namorado. Ela era mantida em cárcere privado há 15 anos – Foto: Isadora Cavalcante

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