
Malu Barreto e Eric Souza
malubarreto@tvclube.com.br
Mais detalhes da história da vida da mulher de 44 anos que trabalhava como doméstica em situação de escravidão moderna, e foi resgatada nesta quinta-feira (15), em Teresina, foi contada pelo Ministério Público do Trabalho – Piauí. O procurador- chefe do MPT-PI, Edno Moura, relatou que a mulher que veio do Maranhão, ficou órfã de mãe e que o pai “deu” para uma família, para que ela estudasse na capital do Piauí.
“Ela foi dada pelo pai, para vir estudar, primeiro ela morou na casa dessa família, depois foi para casa da futura sogra da atual patroa, onde viveu por cerca de quatro anos, depois com o nascimento do primeiro neto, a sogra “deu” para a nora. Nessa casa ela viveu por 26 anos e além de babá, ela fazia também todo o trabalho doméstico”.
O procurador disse ainda que a vítima não tinha noção que era explorada e que se sentia como se fosse da família. “Ela trabalhava todos os dias, sem folga, fazia limpeza e também cozinhava, cuidava dos cachorros, além de ter cuidado dos filhos da patroa. Atualmente apenas a mais nova, de 14 anos, morava na casa, inclusive tem uma deficiência visual e só possui 15% da visão”.
A vítima tinha permissão para estudar e atualmente, aos 44 anos, está no último ano do ensino médio. O procurador-chefe relatou que ela estava matriculada no turno da noite, mas que muitas vezes não conseguia ir à escola, pois estava desgastada do trabalho e também porque não conseguia fazer as atividades extra classe.
“Ela apenas frequentava a escola, mas não conseguia estudar, ia para aula apenas uma vez na semana, e, aos 44 anos, ainda não concluiu o ensino médio”.
Sobre as condições de vida da vítima, Edno Moura disse que ela tinha um quarto, mas não tinha um móvel para guardar seus pertences pessoais, que eram poucos e estavam guardados em uma caixa de papelão, algumas roupas, que ela usava pouco ficava na casa do cachorro. A vítima frequentava a igreja, nos dias de sábado, mas não tinha amigos e perdeu o contato com a família.
“Ela tem irmãs, que moram no Maranhão, a patroa chegou a dizer que queria “devolvê-la”, mas que tinha informações que ela não seria bem recebida pelas irmãs, com as quais ela não tem nenhum vínculo afetivo ou convivência”.
Apesar de não haver sinais de maus-tratos, nem de cárcere, a mulher tinha uma jornada exaustiva e sem salário, não tinha convivência social, não tinha amigos, não tinha convivência familiar. “O que ela recebia, às vezes era um valor de R$ 200 ou R$ 300. Ela acreditava que tinha que trabalhar, porque recebia abrigo e comida, o sentimento dela pela família era de gratidão, por isso ela não se sentia explorada”.
Para a patroa, ela estava ajudando a mulher, que para ela, poderia estar em uma situação pior que a atual. ” Ela não sentia como se tivesse cometendo um ilícito. Por uma questão cultural, as pessoas acham que por estar dando comida e abrigo, você pode colocar a pessoa para trabalhar para você, e está a ajudando. É um sinal trocado, de mão dupla. Estamos tentando romper essa mentalidade e a gente espera que esses casos alertem a população”, finalizou o procurador-chefe.
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