A TV Clube exibiu, nesta quinta-feira (24), o último episódio da série Memórias da Ditadura, que destacou a luta dos familiares na Justiça por reparação e memória das vítimas do regime militar. A série de episódio foi lançada em alusão aos 61 anos do início da Ditadura Militar no Brasil.
Após anos de censura, perseguições e tortura, a Ditadura Militar começou a dar sinais de desgaste na década de 1970. Em 1979, foi sancionada a Lei da Anistia, que libertou presos políticos e permitiu o retorno dos exilados, entre eles muitos piauienses.
Durante a visita do Papa João Paulo II ao Piauí, em julho de 1980, manifestações contra a crise econômica e pelo fim do regime ganharam visibilidade.
O apelo ao pontífice foi registrado pelo fotógrafo Costinha, que capturou o momento em que uma faixa denunciando a fome foi erguida em meio ao público e direcionada ao então líder da Igreja Católica.
O profissional chegou a ser preso, mas conseguiu esconder o filme da câmera fotográfica, preservando o registro de um dia histórico na luta do povo piauiense contra a ditadura.
Diretas Já
As mobilizações contra a ditadura ganharam força em todo o país e culminaram no movimento Diretas Já, que levou multidões às ruas em defesa da retomada das eleições diretas. No Piauí, estudantes, trabalhadores e políticos cassados lideraram os protestos.
O jornalista e ex-militante Luiz Carlos Oliveira foi um dos participantes das manifestações. Ele percorreu diversas cidades do estado em caravanas, tentando mobilizar a população a aderir ao movimento.
“A gente criou comitês. O lançamento foi na Câmara Municipal de Teresina que, inclusive o [presidente da República] Lula esteve presente, quando era sindicalista. A gente fez essa campanha e, no dia a dia, ia para as praças, avenidas, tentando mobilizar a população no sentimento de que nós precisaríamos ter eleições livres e diretas no Brasil para presidente, vice-presidente e demais cargos eletivos”, relata.
A votação que decidiu pelo retorno das eleições diretas aconteceu no dia 24 de abril de 1984, marcado pela grande presença do público nas ruas. Em Teresina, um dos pontos de concentração foi a Praça do Marquês, na zona Norte da capital.
O fim da ditadura militar no Brasil
Apesar da grande mobilização, a proposta das eleições diretas não foi aprovada naquele momento. Somente em 1985 o país iniciou a transição democrática, impulsionada pela pressão popular, que contribuiu para o fim da era militar e, posteriormente, para a promulgação da Constituição de 1988.
O encerramento da ditadura, no entanto, não trouxe a responsabilização pelos crimes cometidos durante as duas décadas de repressão. A Lei da Anistia concedeu perdão também aos militares envolvidos. Para a historiadora Bárbara Bruma, os efeitos dessa decisão são desastrosos.
“Nós tivemos aí uma não-responsabilização das violências e das atrocidades cometidas pelo Estado ditatorial. Qual o impacto disso junto à sociedade? Criou-se a falsa ideia de que a nossa ditadura não foi violenta, de que os crimes cometidos pelo Estado opressor não ocorreram”, considera.
Comissão da Verdade
Com o objetivo de investigar as graves violações aos Direitos Humanos ocorridas durante a ditatura, foi criada em 2011 a Comissão da Verdade. O Piauí, por outro lado, não seguiu o exemplo dos outros estados, mas implantou o Comitê da Verdade de Teresina, arquitetado pela sociedade civil.
De acordo com o coordenador do Comitê da Verdade de Teresina, Pedro Laurentino, ao todo, mais de 100 pessoas estão incluídas na lista criada pelo comitê e 210 pessoas ainda estão desaparecidas até os dias atuais.
“A sociedade civil toda se organizou para fazer o acompanhamento dessa Comissão Nacional. A Comissão Nacional é institucional; os comitês são da sociedade […]. O que tem de importante na Comissão da Verdade institucional é o Estado reconhecendo que houve crimes. Foram 434 brasileiros e brasileiras assassinados pelo regime. Então, nós temos ainda essa ditadura que nunca se encerrou, ela continua hoje em dia”, explica.
O Comitê levantou os nomes de políticos cassados no estado, além de pelo menos dois piauienses que foram assassinados. As vítimas foram identificadas como Antônio de Pádua Costa, natural de Luís Correia, e Antônio de Araújo Veloso, nascido em Bertolínia.
Ainda Estou aqui
A busca pela justiça ganhou maior visibilidade com a repercussão do filme Ainda Estou Aqui, lançado no ano passado. A narrativa conta a história do deputado cassado Rubens Paiva, que foi capturado, torturado e morto pelos militares. O corpo nunca foi encontrado.
A obra cinematográfica ganhou notoriedade em todo o mundo, sendo reconhecido como o Melhor Filme Internacional na cerimônia de entrega do Oscar 2025.
Confira os outros episódios:
Memórias da Ditadura: os relatos de piauienses que lutaram contra a censura