6 de junho de 2025

Confira a última entrevista de Niède Guidon à televisão: “trabalhar naquilo que você gosta lhe garante uma vida feliz”

Niède estava reclusa desde o início da pandemia de Covid-19, por conta de problemas de saúde.

Mayrla Torres

Repórter
Publicado há 1 dia

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Faleceu, na madrugada desta quarta-feira (4), aos 92 anos, a arqueóloga Niède Guidon, considerada uma das mais importantes pesquisadoras da história do Brasil. Ela dedicou sua vida ao Parque Nacional da Serra da Capivara e à criação do Museu do Homem Americano, no Piauí. A causa da morte não foi divulgada.

Niède estava reclusa desde o início da pandemia de Covid-19, por conta de problemas de saúde. Em 2022, aos 89 anos, concedeu sua última entrevista presencial à TV Clube, após se afastar das atividades no Parque da Serra da Capivara. Foi também sua última entrevista para a televisão.

Niède Guidon (Foto: TV Clube)

Confira a entrevista na íntegra:

Renan Nunes (RN): Como foram os últimos 2 anos para a senhora?

Niède Guidon (NG): Muito difícil! Com a pandemia, muitas coisas mudaram, os recursos diminuíram muito. Nós não pudemos manter o mesmo número de funcionários no parque e agora eles terceirizaram a administração do parque. Agora as coisas estão completamente diferentes.

RN: Desde que a senhora deixou a presidência da Fundação Museu do Homem Americano a senhora vive em casa, como a senhora está hoje?

Niède: Por ordens da minha médica estou isolada. Ela disse que eu não devo estar participando de muitas reuniões nem nada, então estou aqui fechada em casa.

RN: Cuidando da saúde logicamente?

Niède: É. Cuidando.

RN: Doutora, mais da metade da sua vida, a senhora dedicou ao seu trabalho aqui no Parque Nacional da Serra da Capivara. Ano que vem a senhora faz 90 anos, que balanço a senhora faz dessa trajetória tão admirada?

Niède: Os sítios que existiam aqui na Serra da Capivara são uma coisa única, tanto que a Unesco declarou Patrimônio da Humanidade. Quando eu vim aqui a primeira a vez e vi tudo isto, eu compreendi a importância de proteger tudo. Então eu consegui criar a fundação e lutar para manter então o parque nacional.

RN: Doutora, por conta das suas condições de saúde, a senhora se afastou do trabalho do que a senhora sente mais saudade? O que mais tá vivo na sua memória?

Niède: Eu gostava muito de ir ao parque! Eu ia todo dia ao parque, andava muito lá e via todos os animais, a paisagem do parque que é uma maravilha, os sítios arqueológicos e tudo. E agora fico aqui trancada, mas com a idade a gente tem que se acostumar com as mudanças!

RN: Bom e sobre a ópera, a senhora é a grande homenageada este ano. Afinal como a doutora Niède Guidon gostaria de ser retratada?

Niède: (risada) simplesmente como uma arqueóloga que gostava do trabalho, que sempre fez esse trabalho.

RN: E como a senhora recebe essa homenagem? Como foi a reação da senhora ao saber da homenagem?

Niède: Acho que na realidade eu fiz aquilo que eu tinha que fazer como arqueóloga, encarregada aqui. Eu consegui que a França criasse a missão franco-brasileira e vinha todos os anos da França para cá com os meus alunos e fazia as pesquisas e tudo. Simplesmente eu fiz aquilo que fazia parte do meu trabalho.

RN: Como a senhora gostaria de ser lembrada pelas futuras gerações, já que a senhora inspira muitas delas?

Niède: Eu acho que trabalhar naquilo que você gosta e se dedicar a isso é realmente que lhe garante uma vida feliz, tranquilo e tudo né?

RN: E para o futuro, o que a senhora espera?

Niède: Eu não sei, daqui a pouco eu vou embora né? (risos) Procurando viver tranquila até o dia de partir.

RN: O que diria para as futuras gerações?

Niède: Eu acho que as futuras gerações já têm muitas pessoas trabalhando aqui, professores, pesquisadores, eles já sabem a importância disso aqui. Eu acho que o trabalho vai continuar da mesma maneira, temos os dois museus com tudo que for descoberto desses anos de pesquisas, quer dizer: graças ao parque e a tudo que aqui tem nós podemos mudar essa região completamente!

Repórter: Do que a senhora tem mais saudade, a memória que eu tenho de Niède Guidon é daquela pesquisadora de campo, dirigindo no meio da estrada…

Niède: É eu gostava muito de ir ao parque, de trabalhar, de escavar, as descobertas que a gente fazia… mas com a idade, não posso mais fazer. Então hoje tenho que me divertir com outras coisas.

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