
Já começo dizendo que como médica ginecologista 50+, me considero longe de ser alguém que defenda a sociedade machista e preconceituosa frente ao etarismo feminino. Ao contrário do que mencionou a atriz Claudia Raia em entrevista recente, como médicos empoderadores do universo feminino, gostaríamos que todas as mulheres pudessem realizar seu sonho de “maternar” em qualquer idade.
Porém, como médicos, fomos também treinados a pautar opiniões e condutas levando em consideração as evidências científicas e dados estatísticos.
As decisões sempre cabem ao paciente, e decisões pautadas em informações bem fundamentadas são sempre desejáveis para as melhores escolhas.
A ciência não é feita de casos pontuais, individuais e excepcionais, as informações aqui prestadas levam em consideração os desfechos para grandes grupos populacionais.
Dito isso, inicio a resposta à pergunta: Sim, existe risco!
Viver por si só já é um risco, engravidar é um risco e engravidar após os 40 também representa um risco. Riscos são estratificados. Algumas vezes não temos escolhas, mas sempre que as escolhas existem, é sensato escolher o caminho do menor risco, principalmente quando se trata de saúde.
O primeiro risco ao decidir engravidar após os 40 anos, é o risco de não conseguir engravidar. Sim, a idade é inversamente proporcional à fertilidade feminina, de modo que mesmo que você ainda esteja menstruando e ovulando, o comprometimento da reserva ovariana e da qualidade ovular estatisticamente diminuem a chance de uma gravidez espontânea para em torno de 5% por ciclo entre 40 e 42 anos e <2% aos 44.
O segundo risco em questão é o risco de abortamento espontâneo. As justificativas têm base no já exposto acima, isto é, óvulos de “menor qualidade” podem gerar embriões de “menor qualidade”, isso é, com alterações genéticas e incapazes de transpor as barreiras naturais do desenvolvimento. Entre 40 e 42 anos a chance de abortamento espontâneo varia de 30 a 40% e após os 44 anos > 50%.
Terceiro risco: Embriões com eventuais alterações genéticas podem se desenvolver e gerar indivíduos com alterações genéticas. Entre as alterações genéticas mais comuns e compatíveis com a vida está a Síndrome de Down, cujo risco em mulheres aos 25 anos é de aproximadamente 1/1500 nascimentos. Entre 40 e 42 anos este risco aumenta para 1/80 nascimentos e aos 44 anos em torno de 1/30 nascimentos.
Transpostas as etapas de conseguir gestar, não abortar e gerar um embrião geneticamente saudável, vem os riscos inerentes à própria gestação nesta faixa etária: Hipertensão / Pré-eclâmpsia e seus possíveis desdobramentos com parto prematuro, baixo peso ao nascer, descolamento prematuro de placenta e outros, diabetes gestacional e mesmo o risco maior de outras doenças pré-existentes nesta faixa etária com potencial de agravo à gestação.
Não é impossível gestar, mas, se conhecendo os riscos você decidir engravidar mais cedo, muito melhor! Se não for possível, saiba que mesmo conhecidos esses riscos tudo pode dar certo, e você deve arriscar se esse é seu sonho. Muitas mulheres são capazes de realizá-lo.
Faça sua parte tendo um estilo de vida saudável, boa alimentação, atividade física, peso controlado e não hesite em procurar ajuda médica para uma consulta pré-concepcional, fazer exames para avaliar sua saúde global, receber informações e suplementação pré-concepcional.
A reprodução assistida também entra como uma importante aliada em muitos casos nesta faixa etária, embora não haja promessa de solução para todos os riscos envolvidos e represente ainda um alto custo para nossa população.
Ao mesmo tempo que temos o papel de apoiar, estimular e empoderar mulheres a realizarem sonhos em qualquer tempo da vida, temos o dever, como conhecedores de fatos, ciência e estatísticas, de informar e evitar que se crie um ilusório no imaginário coletivo, resultante da multiplicação de falas de celebridades em redes sociais, que possam trazer prejuízos e desapontamentos a uma expressiva parcela da população.
Informar com responsabilidade e empatia será sempre um dos nossos papéis fundamentais.