
Tem gente que acha que comida bonita é só a dos franceses. Ou que prato bem montado precisa ter nomes impronunciáveis e vir com uma pétala em cima. Pois eu, nascido sob o sol do Piauí e com a alma temperada no alho e no coentro, digo com gosto: o sertão também é gourmet, sim senhor! E se duvidar, ainda dá um banho de beleza e sabor em muito prato estrelado por aí.
Dias desses, me meti numa empreitada: preparar um jantar exclusivo para um grupo de donos de pousadas e restaurantes da região da Serra da Capivara — terra de história, de calor e de sabores que contam causos só de entrar na panela. A missão? Mostrar que a culinária nordestina, quando bem tratada, pode brilhar em qualquer passarela… ou melhor, em qualquer passadeira de cozinha.
Cheguei com minha sacola de ideias, um bocado de insumos da região (macaxeira, cordeiro, abóbora, umbú, castanha de caju…) e o desafio de dar a esses ingredientes o respeito — e o glamour — que eles mercem. Porque o que tem de gente subestimando a macaxeira, achando que ela só é boa frita com café, não tá no gibi.
A noite começou com um Ravióli de Cordeiro com purê de abóboras baseadas. Isso mesmo, ravióli. Italiana a receita, nordestino o recheio, e o resultado? Um abraço entre continentes. Usei cordeiro local, temperado com pimenta do reino e amor, e servi com um purê de abóbora que pegou cor e sabor direto do fogo — como manda o figurino do sertão.
Em seguida, veio um Filé de Sol ao molho roti, que é chique de nome, mas nasceu na panela da minha avó. Acompanhado de um mil-folhas de macaxeira que deixou muita batata francesa no chinelo. Prato bonito, elegante e cheio de identidade, daqueles que dá pena de comer — mas a fome e o cheiro ganham sempre.
Para fechar a noite (e abrir suspiros), servi uma Panna Cotta de Umbú, fruta que é puro Piauí, com crumble de castanha de caju e uma calda de maracujá que parecia até carnaval na boca. Doce na medida, cremoso como nuvem de final de tarde e com aquele azedinho que dá vontade de pedir bis.
E ali, entre garfadas e elogios (modéstia à parte, teve gente lambendo a colher), vi nos olhos daqueles empresários a mesma pergunta que já me fiz tantas vezes: por que ainda duvidamos tanto da beleza do que é nosso?
Meu povo, empratamento não é frescura. É carinho. É contar uma história com cores, texturas e sabores. É pegar a simplicidade do interior e mostrar que ela também pode ser arte. Não é enfeite, é respeito pelo ingrediente e por quem vai comer. E se a gente pode montar um prato com queijo coalho, carne de sol e umbu como quem pinta um quadro, por que não fazer?
Então, fica o convite: olhe para sua comida com mais amor. Sirva bonito, coma com os olhos primeiro, e celebre o que o Piauí tem de melhor. E na próxima matéria, prometo mais histórias temperadas e receitas de fazer até francês querer morar se mudar para o Piauí.
Até lá, com uma pitada de saudade e uma panela de novidades!