Defesa da cidadania: promotores percorrem o Piauí e vistoriam mais de 40 unidades da Polícia Civil

As visitas técnicas integram o "projeto MPPI Sempre Presente na Defesa da Segurança Pública"

 

Carlienne Carpaso
carliene@tvclube.com.br

“A falta de condições adequadas de trabalho nas unidades da Polícia Civil do Piauí dificulta a apuração da materialidade e a autoria dos crimes, repercutindo diretamente na qualidade e na celeridade das investigações”. Essa é a avaliação da promotora de Justiça Fabrícia Barbosa de Oliveira, coordenadora do Grupo de Atuação Especial de Controle Externo da Atividade Policial (GACEP), do Ministério Público do Piauí, após analisar os relatórios das visitas técnicas em mais de 40 delegacias no estado.

Infiltrações, fiações expostas, banheiros insalubres, ausência de equipamentos de escritório, salas inadequadas para coleta de depoimentos, poucos funcionários, acúmulos de inquéritos policiais e de bens apreendidos. Esses são alguns dos problemas identificados nas visitas técnicas neste ano de 2021, que acontecem em determinação ao Conselho Nacional do Ministério Público.

GACEP em visita técnica (foto: MPPI)

“Não restam dúvidas de que a atividade de polícia judiciária e, em última análise, o próprio combate à criminalidade, ficam seriamente comprometidos quando o Poder Público se omite em adotar providências para garantir o mínimo de salubridade e segurança dos prédios das delegacias, fornecer material básico de expediente e viaturas em condições de uso, por exemplo”, diz a promotora Fabrícia Barbosa, que assumiu a coordenação do GACEP no segundo semestre de 2019.

Nas visitas técnicas, a promotora observou, de forma generalizada, que nas delegacias do estado do Piauí existe uma ausência de atendimento imediato ao cidadão, que, aliás, é uma diretriz prevista na Lei do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP). “Parte das vítimas deixa inclusive de registrar a ocorrência por não acreditar em uma resposta efetiva da polícia. Isso não é admissível”.

Por isso, “a necessidade de o Ministério Público atuar, de forma permanente, no acompanhamento das condições de funcionamento das unidades policiais, fomentando a adoção de providências, por parte do Poder Público, para sanar as irregularidades existentes”, diz a promotora.

 

O controle externo da atividade policial consiste em função institucional do Ministério Público, prevista no art. 129, inciso VII, da Constituição Federal. 

 

GACEP

No atual desenho institucional do Ministério Público do Piauí (MPPI), o Grupo de Atuação Especial de Controle Externo da Atividade Policial (GACEP) possui natureza de órgão auxiliar, prestando apoio aos membros com atribuições específicas no controle externo da atividade policial, nos termos da Resolução CPJ/PI Nº 06/2015, com as alterações dadas pela Resolução CPJ/PI Nº 09/2018.

Dessa forma, a atuação do GACEP ocorre, primordialmente, segundo a promotora Fabrícia Barbosa de Oliveira, “em casos de maior complexidade, que demandam enfrentamento institucional integrado, bem como na tutela difusa da Segurança Pública, visando sempre a garantir o direito fundamental dos piauienses à Segurança Pública, à prevenção da criminalidade e ao aperfeiçoamento da persecução penal”.

Visitas técnicas nas delegacias do Piauí (Foto: MPPI)

Fabrícia Barbosa comenta que, “no âmbito do MPPI, o GACEP realiza o controle externo concentrado, na condição de órgão auxiliar, procurando trabalhar sob uma óptica de prevenção dos desvios policiais, e não meramente de buscar a responsabilização daqueles que cometeram abusos”.

Ela considera que a atuação do grupo também tem sido positiva nas ações voltadas a fomentar a criação de protocolos de atuação das polícias. Exemplo disso é a criação de Protocolos Operacionais Padrão (POPs), no ano de 2020, no âmbito das Polícias Civil, Militar e da Guarda Municipal, para casos relacionados ao descumprimento de medidas sanitárias preventivas da COVID-19, neste atual período pandêmico.

O GACEP/MPPI atua em parceria com o Ministério Público Federal, Ministério Público do Trabalho, Tribunal de Contas do Estado do Piauí, Tribunal de Contas da União, Controladoria-Geral da União e Controladoria-Geral do Estado do Piauí, dentre outros órgãos.

VISITAS TÉCNICAS 

As visitas técnicas já passaram pelas delegacias de Polícia Civil das cidades de São João do Piauí, Teresina, Barras, Parnaíba e Nazária. Foram 42 unidades da Polícia Civil visitadas somente na capital piauiense. Os batalhões da Polícia Militar (PMPI) também são visitados pelo GACEP, mas, esta reportagem cita apenas os detalhes nas unidades civis. Ressalta-se que em Teresina 18 batalhões foram vistoriados.

LOCAIS VISITADOS EM TERESINA:

  • Delegacia de Proteção aos Direitos da Mulher – Norte
  • Delegacia de Proteção aos Direitos da Mulher-Centro
  • Delegacia de Proteção aos Direitos da Mulher-Sudeste
  • Delegacia de Proteção aos Direitos da Mulher-Sul
  • 1º, 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 7º, 8º, 9º, 10º, 11º, 12º e 13º Distritos Policiais
  • 21º, 22º, 23º, 24º e 25º Distritos Policiais
  • Central de Flagrante de Teresina
  • Delegacia de Crimes contra a Ordem Tributária, Econômica e Relações de Consumo
  • Delegacia de Defesa e Proteção dos Direitos Humanos e Repressão às condutas discriminatórias
  • Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa
  • Delegacia de Polícia Interestadual do Piauí (Polinter)
  • Delegacia de Prevenção e Repressão a Entorpecentes
  • Delegacia de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro
  • Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente
  • Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente
  • Delegacia de Segurança e Proteção ao Menor
  • Delegacia Especializada na Repressão aos Crimes de Informática
  • Delegacia de Segurança e Proteção ao Idoso
  • Delegacia de Trânsito
  • Grupo de Repressão ao Crime Organizado
  • Gerência de Crimes Funcionais da Corregedoria da Polícia Civil
  • Instituto de Criminalística
  • Instituto de Identificação
  • Instituto Médico Legal
  • Instituto de DNA Forense

Dentre essas visitas, a coordenadora do GACEP, Promotora de Justiça Fabrícia Barbosa de Oliveira, e o Promotor de Justiça Sebastião Jackson Santos Borges, titular da 1º Promotoria de Justiça de São João do Piauí, encontraram a delegacia da cidade com uma estrutura física em péssimo estado de conservação, paredes com rachadura, infiltrações e todos os banheiros interditados, no dia 19 de novembro.

Na Delegacia Especializada no atendimento à Mulher na zona Norte de Teresina, a promotora de Justiça e integrante do GACEP/MPPI, Mirna Araújo Napoleão Lima, conversou com os funcionários, também em novembro. Na época, eles relataram que o período chuvoso provocava ainda mais problemas no prédio, que precisa de reparos emergenciais, incluindo a substituição dos ares-condicionados.

O 22º e o 6º DP Distrito Policial também apresentaram infiltrações, sendo que a situação do 22º DP está ainda mais grave já que, na época da visita, no mês de novembro de 2021, o prédio estava com fiação exposta, deficiência na iluminação e na climatização, incluindo problemas com abastecimento de viaturas.

Os prédios do 9º Distrito Policial, do Departamento de Homicídio e Proteção à Pessoa (DHPP), do Instituto de DNA Forense em Teresina, e o prédio da Delegacia de Nazária, estão com boa estrutura física e manutenção.

Outro problema comum em quase todas as delegacias é a ausência de destinação adequada de bens apreendidos nas operações policiais, principalmente carros e motos, como é o caso da Delegacia de Polícia Interestadual do Piauí (POLINTER), na zona Sudeste de Teresina.

As deficiências identificadas nas visitas técnicas não se restringem ao âmbito estrutural. Na sede da DECCOR em Teresina, o GACEP observou que os delegados possuem quase 120 inquéritos policiais para uma equipe pequena de investigação. A delegacia já solicitou à Delegacia-Geral da Polícia civil do Piauí reforço na equipe. Assim como na sede da DECCOR, o Instituto de DNA Forense também precisa de mais profissionais para atender a demanda.

PROJETO MPPI

As visitas técnicas integram o projeto “MPPI Sempre Presente na Defesa da Segurança Pública”, com coordenação do GACEP.  O projeto “fortalece o controle externo e a Segurança Pública, além de tornar efetivas e resolutivas as visitas técnicas nas unidades da Polícia Civil por meio da coleta e tratamento adequados das informações contidas nos relatórios das referidas visitas”.

COMO FUNCIONA:

  • Criação de fluxo procedimental ou documento instrutório que aborde as providências prévias e ulteriores à realização das visitas técnicas;
  • Criação de painel de Segurança Pública para subsidiar e municiar a atuação do Promotor de Justiça e fomentar políticas públicas na área, especialmente na melhoria das condições de trabalho dos policiais e infraestrutura das unidades policiais visitadas;
  • Elaboração de ranking dos órgãos de Segurança Pública  para acompanhar e fiscalizar a destinação de verbas públicas às unidades prioritárias.

NAS VISITAS TÉCNICAS, O GACEP  IDENTIFICOU OS SEGUINTES PROBLEMAS:

  • Procedimentos policiais tramitando fora do prazo legal;
  • Viaturas locadas com ano de fabricação inferior ao previsto no contrato de locação;
  • Viaturas locadas com problemas mecânicos sem reposição de carro reserva conforme prevê o contrato;
  • Demora no atendimento à população e no registro da ocorrência;
  • Falta da placa de identificação da delegacia;
  • Necessidade de aumentar o número de funcionários; 
  • Ausência dos funcionários no local de trabalho em desrespeito a escala do dia;
  • Má conservação de documentação;
  • Necessidade de uma sala para acolhimento das vítimas;
  • Dificuldade nas degravações de depoimentos (salas não possuem acústica adequada);
  • Banheiros insalubres e/ou sem acessibilidade;
  • Prédios sem manutenção de limpeza;
  • Acúmulo de materiais apreendidos nos pátios e nas salas;
  • Falta de equipamentos e material de escritório.

 

Delegados em campanha por melhores condições de trabalho (Foto: Sindepol)

AÇÃO CIVIL PÚBLICA

O delegado Higgo Martins, presidente do Sindicato dos Delegados do Piauí (Sindepol), já denunciou por diversas vezes a situação precária de algumas delegacias. Ele defende a autonomia da Polícia Civil do Piauí para que possa administrar seus próprios recursos na estruturação e manutenção das unidades.

Martins acredita que “enquanto o Estado não for acionado pelo Ministério Público, que tem legitimidade para a ação civil pública, os policiais e a população continuarão sofrendo com a falta de policiais para atender as ocorrências policiais que não foram possíveis ser evitadas pelo policiamento ostensivo que, por sua vez, também sofre com a falta de policiais militares”.

“Infelizmente, apesar de reconhecer o esforço da gestão para atender algumas demandas de reformas das unidades policiais, as soluções apresentadas foram apenas paliativas”, diz.

Em audiência com o MPPI, Secretaria de Segurança Pública define que vai construir nova Delegacia em Barras (Foto: MPPI)

O Ministério Público do Piauí (MPPI) já ajuizou diversas ações civis públicas em defesa da estruturação das unidades de segurança. Dentre as ações, destacam-se as seguintes:

  • Em audiência pública com os representantes da Secretaria Estadual de Segurança, Polícia Civil, Tribunal de Contas do Estado, Corpo de Bombeiros e Procuradoria-Geral do Estado, o promotor Silas Sereno, titular da 1ª PJ de Barras, comentou sobre a possibilidade de acordo com o Estado, no âmbito de uma ação civil pública movida pelo MPPI. O encontro foi no dia 02 de dezembro.
  • De acordo com o MPPI, “foi obtida uma decisão judicial determinando ao Estado a adoção de medidas, como a reforma da delegacia (de Barras), o incremento de escrivães e agentes, entre outros aspectos visando a melhoria da situação da unidade policial”.
  • A promotoria de São João do Piauí também está com ação civil pública sobre a situação da delegacia local.
  • Em março de 2021, o Ministério Público, por meio da 49ª Promotoria de Justiça de Teresina, obteve sentença favorável em ação civil pública para que o Governo do Estado do Piauí realizasse reforma completa na sede da Central de Flagrantes em Teresina. No entanto, em visita no final de novembro, a equipe do GACEP verificou que a situação no local permanece degradante; apenas uma reforma na fachada acontece no momento.
  • De acordo com o MPPI, “a partir da constatação da deficiente estrutura encontrada na Central de Flagrantes, bem como da precariedade das condições de trabalho dos profissionais de segurança pública na referida unidade, o GACEP emitiu despacho à Secretaria de Segurança Pública para que esta preste esclarecimentos acerca da reforma em curso apenas da fachada”.
  • Essa ação civil pública pela 49ª Promotoria de Justiça de Teresina também inclui as obras de reforma das instalações físicas do 2º DP, do 4º DP, do 10º DP, do 23º DP e do 25º de Teresina. A promotora Myrian Lago é autora da ação.
  • Em novembro, o Ministério Público do Piauí informou que, por meio da Promotoria de Justiça de Alto Longá, “obteve sentença favorável em ação civil pública movida contra o Estado para estruturação da Delegacia de Polícia Civil no município de Beneditinos”.

PROJETO CIDADE SEGURA

O GACEP/MPPI e as Promotorias de Justiça de Corrente iniciaram a discussão sobre o projeto “Cidade Segura” em parceria com os Poderes Executivo e Legislativo das cidades de Corrente, Cristalândia do Piauí e Sebastião Barros. O projeto busca a criação dos Conselhos Municipais de Segurança Pública.

O projeto tem base na Lei Nº 13.675/2018. As Promotorias de Justiça de Corrente vão realizar audiências públicas sobre o tema. Segundo o MPPI, “os gestores dos municípios se comprometeram a elaborar seus projetos de Lei, em conformidade com os Planos Nacional e Estadual de Segurança Pública. Já os vereadores assumiram o compromisso de dar celeridade à análise e à votação das respectivas leis”.

Na foto: PGJ-PI, Cleandro Moura; coordenadora do GACEP, promotora Fabrícia Barbosa; secretário de Segurança, coronel Rubens Pereira e o delegado-geral da Polícia Civil, Luccy Keiko Leal (Foto: MPPI)

PGJ COBRA AÇÕES IMEDIATAS 

O procurador-geral de Justiça do Piauí (PGJ-PI), Cleandro Moura, cobrou da Secretaria Estadual de Segurança e da Delegacia-Geral da Polícia Civil ações “imediatas para assegurar melhorias nas condições de trabalho e de estrutura física da Central de Flagrantes e dos Institutos de Medicina Legal e de Criminalística”.

Reunião PGJ (Foto: MPPI)

Na última terça-feira (7), o procurador-geral de Justiça Cleandro Moura esteve em reunião presencial com o secretário de Segurança, coronel Rubens Pereira, e com delegado-geral, Luccy Keiko Leal. A coordenadora do GACEP, promotora Fabrícia Barbosa; o diretor do Departamento de Polícia Técnico-Científica da Polícia Civil do Piauí, Antônio Nunes; a chefe de gabinete do PGJ-PI, Cláudia Seabra; o coordenador do Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça Criminais , Luciano Ramos e a secretária-geral do MPPI Everângela Barros, também participaram do encontro.

No encontro, o procurador-geral Cleandro Moura reforçou a “necessidade de ações de integração das atividades de segurança pública em consonância com a atuação ministerial como forma de garantir que as irregularidades identificadas durante as inspeções sejam sanadas”.

REFORMAS 

Procurada pelo Portal ClubeNews, a Secretaria de Segurança Pública do Estado do Piauí confirmou que um processo de licitação já está em andamento para reforma de algumas unidades policiais.

O secretário de estado da Segurança Pública, Rubens Pereira, esclareceu que está autorizada reforma predial em várias delegacias, inclusive a da cidade de São João do Piauí. O contrato foi assinado na primeira semana de dezembro de 2021, com recursos autorizados pela Secretaria Estadual da Fazenda.

Rubens Pereira ressalta que diversas delegacias em Teresina serão beneficiadas com a liberação do contrato de manutenção predial.

“Além disso, há construções em andamento como em Canto do Buriti, Domingos Mourão, Esperantina, Marcolândia e DEPRE (em Teresina). Quanto a Barras, a delegacia velha será demolida para construção de uma Unidade Integrada que abrigará a Polícia Militar e a Polícia Civil. Tratativas já estão sendo feitas com o prefeito de Barras para destinar espaço a fim de instalar provisoriamente a delegacia até a obra nova ser concluída, cujo processo para licitar está em trâmite”, citou o secretário.

Somente neste ano, o Governo do Estado já nomeou 165 aprovados no concurso público para a Polícia Civil do Piauí. O edital é do certame realizado no ano de 2018, com 350 vagas, sendo 50 para delegados, 50 para peritos criminais e 25 para agentes. O quadro atende todo o estado. A banca organizadora foi o Núcleo de Concurso e Promoção de Eventos (Nucepe).

“Em fevereiro [de 2022], convocaremos para o curso de formação os novos agentes da Polícia Civil. Estamos avaliando pedido para convocação de alguns peritos que ainda podem restar do último concurso. Foi solicitado à Secretaria de Estado da Administração concurso para escrivães”, destacou o secretário.

Para o secretário de segurança, o Ministério Público do Piauí “tem sido um parceiro importante e continuará sendo com suas vistorias técnicas”.

“Seguiremos as recomendações, que são extremamente técnicas, sempre com abertura dos procedimentos administrativos, verificando a capacidade de resposta financeira para as demandas, mas com a certeza de que juntos, governo e Ministério Público, estamos buscando melhorias com os recursos disponíveis”.


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